Discussão num bairro de classe média alta em Porto Alegre, RS, viralizou nas redes neste sábado (17) porque um homem negro agredido a faca chamou a polícia, denunciou o crime, mas acabou detido, enquanto o esfaqueador, branco, conversava naturalmente com os policiais, e só mais tarde se entregou. A vítima é o motoboy Everton Henrique Goandete da Silva, 40 anos, atingido com a arma branca, por um homem branco, grisalho, com quem teve uma discussão. Nas redes sociais há clamor para que o episódio seja investigado por racismo.
Chamados para intervir, policiais do 9º Batalhão de Polícia Militar detiveram em flagrante Everton por desacato à autoridade, porque consideraram que ele estava agressivo. O homem que portava a faca também foi detido em flagrante.
Após serem levados para o plantão de uma delegacia da Polícia Civil, ambos acabaram liberados, para responder pelos delitos em liberdade. A Brigada Militar abriu sindicância para apurar o caso, e a lesão causada ao motoboy foi leve.
Conforme moradores ouvidos pela reportagem, o homem branco grisalho reside no local e costuma reclamar da aglomeração de motoboys, no outro lado da calçada do seu prédio. O nome dele não foi divulgado pelas autoridades.
Em determinado momento começou uma discussão entre ele e o motoboy Everton. Foi quando o homem grisalho, que estava sem camisa, sacou de uma faca e talhou o pescoço do motociclista, que sofreu um corte superficial. Colegas do motoboy saíram em ajuda dele e moradores chamaram a BM, segundo detalha Humberto Trezzi, do jornal gaúcho Zero Hora.
Uma das pessoas que registraram a abordagem com um celular é Leandro da Silva Magalhães, também motoboy. O vídeo mostra que, em determinado momento, Everton reclamou da situação. Um soldado da brigaad pediu para ele não gritar, interpretou a reação do motociclista como desacato e o prendeu, junto a outros dois policiais, enquanto o homem grisalho não era abordado. Everton foi algemado pelos PMs e levado para um camburão.
Os PMs também interpelaram o agressor grisalho. Subiram até o apartamento dele, onde vestiu uma camisa e então se entregou, sendo levado pelos policiais em outra viatura.
— Para nossa surpresa, os policiais prenderam o motoboy e só depois foram atrás do agressor. Só porque o motociclista estava um pouco nervoso. Ou será porque ele é negro? Já o homem branco teve oportunidade de se livrar da faca no seu apartamento — reclama uma das testemunhas da ação policial, a psicóloga Marina Medeiros Pombo. Ela é integrante do Conselho Estadual dos Direitos Humanos e vai propor investigação por racismo, relativa aos policiais.
O motoboy e seu agressor foram algemados e conduzidos até a 2ª Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (da Polícia Civil). Ambos ficaram em celas separadas, fizeram exame de corpo de delito (para constatar ferimentos), prestaram depoimento e foram liberados.
A reportagem tentou falar com o homem que agrediu o motoboy, mas ele ainda prestava depoimento. Aos policiais, ele disse que levou um chute do motociclista. Os policiais envolvidos na dupla prisão não quiseram dar seus nomes. Um sargento que estava com a guarnição interpreta o caso como uma sucessão de equívocos, cometidos por gente nervosa.
Ele ressalta que os PMs levaram os dois para evitar um linchamento do homem que tinha agredido o outro com uma faca. O policial também diz que a arma não foi apreendida porque estava dentro do apartamento do agressor e eles não tinham mandado judicial, mas salienta que há imagens que mostram o homem grisalho com a arma na mão, que podem resultar em prova do fato. Os policiais civis não quiseram comentar oficialmente o episódio.
Foto Renato Levin Borges / Divulgação.